Solitude, darkness and love


"I don't wanna admit, but we're not gonna fit"

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Hidden Place - Capítulo 10: A vida dela


E exatamente, naquele instante, Deus olhou para Frey, com compaixão, assim como Frey olhara para Heimdall um dia desses,

acho que isso se chama universo.

O universo é uma forma que se escorrega por entre os dedos, é como água, é como um deserto de espelhos e cacos no chão, você se perde, você se fere, você enxerga somente a si mesmo. Não se pode dizer também que não é uma sombra, ou várias linhas de costura da morte e da vida.

Nós somos a roupa.

Inicialmente Hermod não sabia o que fazer vendo o corpo trêmulo de Frey, ficou apenas ali, parado, com medo, o que está acontecendo com ele? Enquanto que há algumas quadras daquela pequena cidade, Forseti levantava da cadeira de espera, com o coração a mil, prestes a arrancar seu filho do ventre, como se tira a pulga de um cão, pressionando com as unhas até matar a criatura parasita, naquele momento ela o sentia como um parasita também, e não como um ser mais belo do mundo, um presente dos anjos. Sua culpa era maior.

Heimdall apenas a vigiava com o olhar morno, sem transparecer concordar ou discordar da decisão de Forseti, mas Forseti de alguma forma se sentiu repreendida, como se ele dissesse "não faça isso". Forseti suspirou e tentou manter a calma, ainda era tempo de voltar atrás, mas o que será de mim?

E ela entrou onde fora chamada, e Frey começou a ficar inconsciente, eu tenho que tomar uma decisão, eu preciso tomar uma decisão.

Um outro garoto que passava ali perto logo reconheceu Frey. Foi em direção a ele. Pegou uma caneta e a penetrou com força na coxa do rapaz. Frey num susto levantou. E olhou para Hermod, evergonhado. E chorou.

- Seu estúpido, você tem que aprender a se controlar. - Disse o rapaz. - Se você morrer desse jeito pode sobrar pra mim.

- Me desculpa, eu estava desesperado.

- Desespero não é motivo. Todos nós somos primatas orgulhosos com uma auto-confiança barata estampada na cara, cheios de dor e desespero. Se enxerga idiota. - Resmungou o desconhecido.

- Você vai parar de vender isso pra mim? - Disse Frey esfregando os olhos.

- Você nem vai pensar em comprar isso mais, Frey. - Falou Hermod, ainda assustado com toda aquela adrenalina repentina.

Frey encarou Hermod, de uma forma duvidosa, mas logo cessou o comportamento ansioso. Hermod o levantou e foram embora para casa, o desconhecido ficou apenas ali, pairado no seu cotidiano, que, para ele, não era grande coisa.

E os segundos também se balançavam para Forseti, que hesitou um pouco enquanto observava a sala de atrocidades, sentiu um cheiro forte de desinfetante, viu vários objetos médicos numa bandeja prateada, a luz branca e forte nos olhos, suor frio, culpa, uma médica, culpa, e culpa. Ela não aguentou e logo saiu correndo daquela sala, e depois da clínica, com medo, cheia de insegurança, e outra decisão tomada.

Heimdall logo chegou perto dela, com um ar compreensivo, colocando a mão nos ombros de uma Forseti ajoelhada, com a neve molhando sua calça, suas botas pretas aquecendo seus frágeis pés, e todo agasalhada, tirou o cachecol e aguentou o choro.

- Eu... Não tenho coragem de fazer isso. Não é o certo.

E o que seria o certo? O errado?

- Vamos pra casa, Forseti, seu dia foi mais longo do que parece.

- Eu quero ver o mar.

Heimdall pegou a sua mão, e foram em direção ao som das ondas. O sol como sempre morno, o pássaro negro observando tudo por ali, e foi assim que Forseti terminou o seu dia. Sonhando ver o mar e ouvir as ondas, asas, núvens e um sol bem quente, num verão nostálgico, numa vida comum e cheia de felicidade, ao lado de seu filho.

~

E o natal chegou, para Heimdall, Forseti e Hermod, não era um grande dia. Heimdall como sempre sem descanso algum na faculdade, Forseti na pediatria ajudando a mãe, Hermod em casa olhando para o nada, e Frey, arrumando suas malas, feliz, indo para a casa de Hermod, Hermod morava sozinho, mas ainda era sustentado pelos pais, que ficavam muito longe dali. Frey colocou sua última camisa. Seu padrasto entrou no seu quarto.

- O que você pensa que está fazendo? - Grunhiu Loki.

- Eu vou sair daqui.

- E quem te deu permissão, moleque?

- Eu não preciso da sua permissão.

O som de um tabefe silenciou tudo.

- Nem pense em fazer isso. - Ameaçou.

Frey levantou a sua mala, Loki o empurrou e o socou até Frey ficar todo inchado. Partiu. Frey descansou ali mesmo, cansado daquela mesma rotina, daquele mesmo ciclo vicioso, o rosto inchado, cheiro do próprio sangue, frio, muito frio. E disse para si mesmo, bem baixinho, tão baixinho que nem Deus pôde ouvi-lo e ajudá-lo dessa vez.

"Eu vou acabar com tudo isso de uma vez, agora mesmo."

E sonhou, sonhou estar ao lado de Freya, abraçando-a, amando-a como se ama imensamente uma irmãzinha que tem o melhor amor do mundo.

Seu amor estava longe.

E cortou os pulsos com uma navalha. E sangrou até morrer.


Eu quero ver o mar.









~










Andrew Oliveira

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