Solitude, darkness and love


"I don't wanna admit, but we're not gonna fit"

quarta-feira, 11 de abril de 2012

All Is Full Of Love


No clima do curso que estou fazendo aqui em Belo Horizonte, Cinema e Audiovisual, aqui vai na íntegra meu trabalho de Cinema de Animação. A regra era escolher um diretor e falar sobre ele ou sobre alguma de suas obras. Eu, obviamente, escolhi sem nem mesmo pensar All Is Full of Love da minha deusa Björk, dirigido pelo badalado e genial Chris Cunningham (conhecem Frozen da Madonna? A mente por trás desta Hécate pop e tão bem representada é ele.).Chris Cunningham é um cineasta britânico de videoclipe e video-arte. Ele nasceu em Reading, Berkshire, em 1970, e cresceu em Lakenheath, Suffolk. Além de cineasta, é músico, produtor e fotógrafo. Responsável por um dos videos mais emblemáticos de todos os tempos. Preparado? =)

Um robô é uma criatura inorgânica, ausente de sentimentos, gestos involuntários, vazio e gelado, movido por engrenagens lubrificadas com óleo, moldado a partir da matéria prima de metais, pesado, perigoso. Uma imitação do ser humano, um manequim mais forte e rígido, uma bizarrice bela da tecnologia, uma representação de atitudes humanas e, sendo assim, de um grande significado imagético, um robô é uma máquina criada apenas para determinada função, e sendo assim ele deve fazê-la repetidamente sem a interrupção do chamado "cansaço humano", sua inteligência é mecânica e limitada, nascida de cabos elétricos e chips, perfeita para acelerar a produção de mais máquinas, mais inteligências iguais, um rebanho de ferro e parafusos criando exércitos das mesmas coisas fazendo as mesmas operações criadas das mesmas funções.
Talvez seja importante, então, a ausência de sentimentos, a frieza e, de certa forma, a crueldade em ser um boneco verossímil do corpo humano. Um robô não tem músculos, artérias, ligamentos cartilaginosos, pele e sangue. Mas ele tem uma força maior, um desenvolvimento indestrutível, é mais eficaz e menos fálico, uma disposição que os limites humanos não permitem. É verdade que um robô uma hora começa a apresentar problemas, e rapidamente pode se quebrar, sua bateria acabar, seus cabos arrebentarem, mas tão velozmente quanto ele é destruído, ele é substituído por um novo, um modelo mais avançado, com mais funções, com menos probabilidades de sua data de validade se aproximar. Um robô é um reflexo de uma criatura colossal e faminta, cheia de tentáculos venenosos, barulhenta e aterradora, chamada Ego.
Seria completamente impossível então, duas criaturas com os mesmos mecanismos, o mesmo pensamento pré-determinado, a mesma forma e compartilhando da mesma consciência imitada, se amarem? Sentirem o toque de suas entranhas frias, partilhando de gestos incompreendidos, se oferecerem, se entregarem?
Chris Cunningham obviamente, não deixa claro se o tempo que vemos passar é cronológico ou psicológico, se suas duas personagens, as duas Björk's robóticas e melancólicas, podem ser a representação de uma sátira às condutas humanas, aos seus limites e valores de impor definições a sentimentos que eles próprios, os seres humanos, não entendem.
Somos convidados a entrar numa clínica para reparos de robôs defeituosos, vemos e ouvimos a robô cantar sobre o amor, declarar os sentimentos de outrem que se fechou com o medo da mais simples permissão de amar. Para quem ele canta? Alí há apenas ele e grandes parafuseiras terminando de moldá-lo, fazendo seus últimos reparos. O que aconteceu com um robô que canta sobre o amor estar alí precisando de manutenção? Algo nele não deu certo?
As cenas movem-se então como se estivessem voltando, a lubrificação, a água, retorna. A água nunca retorna, ela segue seu rumo e encontra caminhos até mesmo entre rochas e colinas, na terra e no fogo, já disseram provérbios chineses. A água é a metáfora perfeita do tempo, o tempo cronológico é claro, pois quem pode controlar o psicológico? É estranho pois passamos a entender que, em vez de estar sofrendo reparos, o robô está sendo destruído pelas máquinas de manutenção, aquelas que até então tinham a função apenas de renovar e construir. Mas o outro robô, idêntico ao primeiro, entra em cena, ele o convida, ele canta junto, e como o seu parceiro, possui seios artificiais para identificar seu sexo. Duas robôs que se comunicam, veem algo em comum, elas não estão sendo renovadas, estão sendo desconstruídas, pois muito provavelmente estão ultrapassadas ou suas datas de válidade já chegaram.
Há então uma explosão de mensagens num único gesto, a robô a convida para sair daquele lugar, e juntas impulsionam a maior forma física de amar: o beijo. Elas não veem diferenças, são iguais, e quando há o amor surgindo, quem terá o direito de julgar sexo, gênero ou cor? Elas precisam daquilo, elas estão sendo extintas, estão sendo assassinadas lentamente pelas máquinas que não permitem que robôs tenham sentimentos, se declarem, se comuniquem e, acima de tudo, sejam humanos. Estão sendo oprimidas pelos seus iguais, pois elas também são máquinas, há uma anarquia imposta pelas ditadoras mais fortes e soberanas naquela sociedade, as que constróem e destróem e, por isso, tem a consciência de que podem fazer o que lhes for conveniente. Afinal, as máquinas opressoras também tem sentimentos, porque elas não estão permitindo, elas estão sendo hipócritas e contraditórias com suas crenças de que duas robôs idênticas não podem amar.
Uma contradição, obviamente, ainda maior e mais forte presente no curta, é a ironia extrema de dois robôs amando, levando-nos às vertentes das críticas sociais sobre a frieza humana, os estereótipos, o conformismo em ser igual, em não fazer tanto quanto deveria, apenas seguir aquilo a que lhe foi designado. A fotografia final nos faz captar que as duas robôs apaixonadas estão no meio de um coração, formado pelos braços violentos das máquinas opressoras que estão destruindo-nas enquanto estas usufruem dos seus últimos momentos antes de suas células de bateria acabarem. Uma ironia ainda maior, é claro, pois aquilo que as destrói, é aquilo que forma o que elas acreditam terem: o órgão representativo do amor, o mais vital e protegido na caixa torácica, a queda livre, a pulsação mais forte, o calor mais intenso, a dor mais impiedosa: o coração.

"Você receberá amor,
Deixe-se receber os cuidados,
Você receberá amor
Permita-se confiar nisso
Talvez não das fontes
Em que derramastes
Talvez não das direções
Em que ainda observas
Mova sua cabeça
Está tudo ao seu redor
Tudo está cheio de amor
Tudo ao seu redor

Tudo está cheio de amor
Você apenas não está recebendo
Tudo está cheio de amor
Seu telefone está fora do gancho
Tudo está cheio de amor
Suas portas estão todas fechadas..."

Permita-se confiar nisso.










~







Black Cherry

Um comentário:

  1. Cara, adorei mesmo. Não conhecia o trabalho de Chris Cunningham, mas depois de seu post gostei muito.
    Parabéns pelo trabalho. ^^

    ResponderExcluir