Solitude, darkness and love
"I don't wanna admit, but we're not gonna fit"
sábado, 21 de abril de 2012
Reaction
Eu sou um pouco de cada crime que cometes
E sou um pouco dos teus detentores
Eu sou também a exceção que escondes da luz
E sou o estrondo que tuas pálpebras fazem quando se fecham
Eu quero me perder, sobre o limbo que criamos
O mundo de sombras, calor e água, que criei para me abrigar
Eu quero me ouvir, e quero me ver, e sobre a fortaleza dos teus punhos
Me diluir em desapego de nunca mais poder sonhar
E se já me perdi alguma vez, corri entre pinheiros brandos
Montanhas confusas, céus encantados, noites voluptuosas
Então devo ter encontrado, por um átimo e por um piscar de olhos
Por uma surpresa e por uma pequena vista, o teu mero movimento
E ele já disse que sim, mas que num momento depois
Deve ser por isso que não sei mais porquê
E se vou saber algum dia, se chegarei a desvendar a sensação do teu calor
Sobre a terra, sobre as folhas, espremendo nuvens, tapando sóis
Engolindo arco-íris, descansando em pássaros marinhos
Fluindo, despencando, lá no fim, fiquei cego
Contando palhetas de redemoinhos
Ou posso estar cansado demais para ir embora.
~
Black Cherry
Photografia: Cena do filme Napola
quarta-feira, 18 de abril de 2012
Don't Look At Me
Bernarda havia parado de gritar, já estava rouca demais. Seus seios foram pressionados pelas mãos de um deles, enquanto o outro abria o zíper da calça bege-escura e posicionava minha irmã em cima do capô de um jipe. Bernarda não gritou nem quando um deles a penetrou, e o outro fez o mesmo, repetidamente, até decidirem jogá-la ali mesmo e irem embora. O que teriam falado para o general? Ela havia se descontrolado e eles foram obrigados a matá-la? Essa é uma das incertezas que nunca consegui tirar da minha cabeça. E minha irmã, minha irmã sendo estuprada e assassinada na minha frente. Quem era eu para cuidar daquela menininha encolhida na escuridão?
Um aperto no meu peito me fez sentir uma ardência em minha pele, como se tivesse sido acabado de ser arranhada fortemente por unhas imundas. Busquei Emeline novamente para apanhá-la em meus braços, joguei um colchonete mofado no chão do porão e esperei minha sobrinha dormir.
A porta da cabana foi escancarada, assustado, saí de perto do homem que me abraçava e olhei amedrontado para a luz que violentava minhas pupilas. Vários cordeiros de Fürher entraram para arrastarem os mortos por hiportemia e jogá-los em alguma vala qualquer. Desejei que eles não tivessem a certeza que eu estava morto também. Me sentia podre, frio, pútrido, me decompondo a cada respiração que soltava, meu nariz parecia estar prestes a quebrar. Alisei minhas mãos sem sensibilidade, movi os dedões dos pés gelados. Tossi, tossi de novo, desejei tirar os espinhos da minha garganta. Saiu sangue.
Acordei Emeline, a luz da janelinha do porão que residia em cima da despensa deu direto no meu rosto. Banhei-a, vesti-a, escovei seus dentes, deixei-a no seu quarto com uma boneca no colo enquanto fui fazer o mesmo. Precisamos sair daqui.
Estava cada vez mais difícil me mover. Não deixe que eles digam que você morreu, não faça com que eles acreditem na sua morte. Ela é interna, ela é interna, a neve não está aqui, ela não existe, eu não estou mais aqui.
- Onde está a mamãe? Ela estava gritando tanto ontem... - Emeline acariciou os cabelos de mentira da sua boneca de porcelana, e a deixou cair no chão. Aquilo era uma porcaria.
- Eu não sei onde está mais a sua mãe, Emeline. - tentei falar da forma mais amena possível, mas as palavras saíram violentas de qualquer forma.
- O que vai acontecer conosco?
- Vamos para outro lugar.
- Que lugar.
- Não sei...
- Para onde?
- NÃO SEI!
Perdi as rédeas, Emeline sentiu minha voz alta e firme como uma bofetada e começou a chorar.
- Emeline, por favor, estou confuso.
- Não grite comigo.
- Prometo que não.
- Então para onde vamos?
- Vamos para onde seja seguro.
Peguei seu pulso com carinho, e depois sua mão entrelaçada à minha. Procurei uma mochila preta e coloquei o que ainda havia de comida na geladeira e na despensa dentro dela. Enchi Emeline de casacos e saímos para a rua deserta. O jipe ainda estava lá, resolvi ignorá-lo e assim passamos a manhã procurando algum lugar, qualquer um, em que pudessemos estar a salvos. Emeline quase gritou quando o barulho de uma sirene começou a ficar mais forte e presente aos nossos ouvidos. Olhei para todos os lados e só havia portas e grades fechadas, ninguém à vista a não ser a ameaça de bombas vindas dos céus, canções de boas-vindas ao inferno.
- Ei!
Olhei para a direita.
- Ei! Aqui.
Olhei para a esquerda, e depois para uma esquina mais adiante. Um rapaz agitado acenava para mim e Emeline segurando firme minha mão, com uma mochila rósea desbotada guardando apenas algumas roupas. Decidi ir ao que nos chamava. Ele era como nós, o nariz protuberante, os cabelos escuros, espessos e lisos, mas provavelmente mais bonito, a maxilar séria e rústica, tonalizando um rosto extremamente masculino, compatível com seus ombros largos e seu peitoral óbvio sobre o casaco branco. Para mim, bastante alto, para Emeline, uma montanha.
- Não tenho mais para onde ir. - falei entristecido.
- Entre, não há mais ninguém aqui além de mim e uma boa quantidade de comida.
Sorri meio sem graça e entrei. Emeline olhou desconfiada para ele, mas mesmo assim também resolveu entrar. Ela havia sido ensinada a não receber gentileza de estranhos. Mas naqueles anos, naquele inverno todo, quem não era um estranho para o outro?
- Senhor, acho que esse aqui está quase batendo as botas também. - Um jovem nazista cutucou minha bochecha gelada, pude ver de relance que o homem que havia me acolhido me olhava com desespero, o que eu significava pra ele naquele momento?
Emeline e eu fomos convidados a entrar numa sala iluminada a velas em candelabros, janelas ocultas por cortinas escuras e grossas. O rapaz nos ofereceu comida recém-preparada, lençois, travesseiros e um canto para dormirmos. Agradeci a ele várias vezes e esperei Emeline adormecer para que pudéssemos conversar.
- Desculpe por não ter me apresentado ainda, quando vi vocês me senti de certa forma feliz, faz algum tempo que não vejo ninguém. Me chamo Abelard. - Abelard me deu um aperto de mãos.
- Audrick, e a menina é minha sobrinha Emeline.
- O que aconteceu para vocês correrem esse risco de sair andando por aí?
- Uma história complicada.
- Conte-me.
Pela primeira vez senti o peso dos acontecimentos afogar o meu coração com violência e rancor. Arfei e me encostei na parede.
- Ei, ei. Está tudo bem. Estamos juntos agora.
Meus olhos embaçaram, senti o braço de Abelard ao redor do meu ombro. Algo travava a minha garganta e minha cabeça dava voltas e voltas. Meu coração estava cada vez mais afogado. Meu pai desaparecido, minha mãe morta, minha irmã morta, apenas eu e Emeline no mundo. O barulho das sirenes, a neve manchada de sangue, portas escancaradas. Por que a vida real agora parecia um pesadelo completo?
- Eu...
Abelard fez eu me concentrar no seu rosto com suas mãos nas minhas bochechas.
- Está tudo bem, Audrick. Ficarás seguro agora.
Tentei chorar escandalosamente mas não consegui. Meu único êxito foram lágrimas escorrendo sem parar como uma goteira insistente num dia devastado por uma chuva qualquer. Sentei e me encolhi, aquele maldito barulho fazia minhas mãos ficarem trêmulas. E por que eu não conseguia mais falar? Por que diabos a minha voz não estava saindo?
- Vamos, levante, vá para perto de Emeline.
Me recusei, parecia que eu estava recebendo algum tipo de ordem. Não queria mais ser obrigado a nada.
- Audrick...
Comecei a empurrar o compreensível Abelard, afastá-lo mais enquanto ele ainda tentava se aproximar de mim.
- Saia...
- Audrick, por favor, peço que não se desespere. Já disse, você ficará seguro aqui. Não quero que você chame a atenção por...
Não, não, não. Führer, maldito Führer, desgraçado, cretino, abortado, filho da puta, filho da puta, filho da puta, filho da puta.
- Audrick...
- ME DEIXE EM PAZ!
Finalmente minha voz saiu, finalmente consegui chorar e socar o peitoral de Abelard. O que estava havendo? Eu não tinha controle sobre os meus próprios músculos.
- Por favor...
Minha voz estava enfraquecendo de novo, eu não sentia mais meus punhos, Abelard ainda estava na minha frente, insistindo para que eu conseguisse me controlar. Droga, agora ele provavelmente me expulsaria dalí com Emeline e nós dois realmente...
- Não estou morto... - Sussurrei entre dentes para o jovem de sorrisinho debochado que me cutucava com seu dedo imbecil.
- O quê? Não ouvi direito, ratinho. - ele gargalhou e olhou para trás, esperando que sua piadinha sobre nos comparar a ratos fosse aprovada pelos outros.
- Não... Estou... Morto... - Coloquei a mão sobre os cílios, a cabana parecia mais iluminada do que nunca. Por que abriram aquela maldita porta?
Senti um peso me apertar e uma respiração cair sobre a minha caixa torácica. Era Abelard me abraçando, me acalmando. Quem eu era para ter o direito de receber a gentileza de estranhos? Queria que ele me soltasse, afastasse seu calor de mim. Eu me sentia tão envergonhado por aquilo tudo...
- Audrick, fique calmo. Tenho certeza que Emeline não gostaria de vê-lo assim, já que você é a única pessoa que ela tem agora... Audrick, eu também estou com medo, muito medo, e não suporto ficar aqui todos os dias da minha vida. A qualquer momento isso aqui pode ir tudo pelos ares... E do que vai adiantar todo o meu esforço?
Ouvi soluços, assim como eu, ele também estava descarregando seu peso em mim.
Dois homens me suspenderam pelos braços, não vi necessidade pois eu estava magro e leve, mas eles pareciam ter adquirido uma espécie de nojo físico por nós. E começaram a me arrastar para fora da cabana. Minha garganta secou novamente, olhei para o Cristo crucificado que havia me dado um pedaço de pão e um pouco de água de uma chuva envelhecida, ele começou a chorar em desespero e eu passei a gemer e chorar junto. As lágrimas congelaram e minhas pálpebras se machucaram, meus olhos foram perfurados pelo branco excessivo da neve cruel e arrogante chiando nas minhas costas, nádegas, coxas, pernas, o que restou dos meus pés. Vi fumaças negras contrastando o céu exageradamente pálido e lúcido naquela realidade tão distorcida e mórbida. Algo molhou a minha garganta dolorida. Era o sangue de novo.
- Esse não vai durar muito também. - disse o que me puxava pelo braço direito.
- Vamos jogá-lo na vala, vai morrer de qualquer jeito. - respondeu o que havia feito a piadinha de escárnio com a minha cara na cabana. Ele era bonito sobre a luz do inverno, afinal. Louro, nariz aquilino, olhos claros, pele saudável, branda e quase monocromática com as sobrancelhas e as pestanas claras. Um exemplo autêntico da raça perfeita que o Führer proclamava. Mein Kampf teria razão?
Os dias estavam mais insuportáveis do que o esperado. Emeline, Abelard e eu apenas comíamos, jogávamos cartas, tomávamos banho e depois íamos dormir. Eu estava começando a achar estranho tudo estar tão quieto e parado, sem o barulho eterno das sirenes e suas luzes vermelhas piscando, poluindo a noite e o dia, fazendo parte do nosso cotidiano. Criei uma afeição imensa por Abelard, ele era extremamente carinhoso com Emeline que também havia cedido sua confiança a ele, e estava cada vez mais aberta, extrovertida e sorridente, algo tão raro naquela menina tão silenciosa, tão estranhamente misteriosa, e no entanto gentil e compreensiva. Abelard lhe contava suas histórias enquanto Emeline lhe retribuía com poemas, ainda confessando também que não via a hora de completar as 15 primaveras para usar maquiagem. Ela sonhava com uma fotografia em que ela estivesse com pó-de-arroz e batom, como uma verdadeira princesa.
Houve uma madrugada de insônia em que descobri Abelard num canto, soluçando quase imperceptivelmente como Emeline certa vez num segundo porão. Olhei de relance por um armário pois não queria que ele se sentisse constrangido com aquilo.
- Eu sei que você está aí.
Desisti do meu esconderijo e me sentei ao seu lado. Esperei que ele falasse ou que quisesse falar alguma coisa, justificando suas lágrimas, contando sua história tão escura e pouco esclarecida.
- Eu não gosto muito de lembrar da minha vida, como eu a vivi ou como a estou vivendo agora. Me sinto numa espécie de limbo consciente, em que eu sou o espectador do meu próprio eu... Isso é tão confuso...
"Mas há algo, uma lembrança forte que eu não consigo... Esquecer, ou seja como for...
"Eu costumava passar as férias na casa da minha tia porque eu a adorava e amava as minhas primas.
"Ela e meu tio eram extremamente carinhosos comigo. Aquilo poderia ser o significado da felicidade pra mim. Lá, nunca deixei de me sentir amado, nunca me senti desamparado ou deslocado, não havia a solidão que minha mãe pesava sobre a minha presença, sustentando aquele olhar amargurado como se eu fosse alguma espécie de monstro que invadia a sua casa apenas para incomodá-la..."
"Então houve uma tarde. Uma tarde em que minhas primas e minha tia foram fazer compras... Essas coisas femininas em que a presença de homens não é bem-vinda. Meu tio foi no quarto de hóspedes e começou a conversar comigo sobre... Sobre coisas mais íntimas. Eu tinha uma pequena noção do que ele falava... Mas mal havia completado doze anos..."
Abelard esfregou os olhos e segurou as mãos trêmulas, aflitas. Depois, com um gesto desleixado, tirou o suor frio da testa lisa e sem rugas. Ele não conseguiu mais falar, e nem sequer tentou terminar a história. Afinal, histórias assim não costumam acabar.
- Eu... Estou... Vivo... - Minhas roupas listradas com aquele bizarro azul desbotado já estavam encharcadas, mas os dois soldados continuaram me arrastando até a vala. O triângulo rosa colado no meu peito, como a queimadura de um gado.
- Não chore mais Abelard, eu estou aqui. - Levantei o queixo de Abelard com carinho, e sua expressão era a perfeita face do mártir. Os cabelos negros como um véu a emoldurar-lhe e ressaltar a palidez do rosto e o olhar acastanhado. Ele tinha um suave sinal perto da maxilar. O sinal se aproximou do meu queixo e ele pôs o rosto úmido no meu pescoço, me abraçando mais forte do que a primeira vez em que me abraçara. Senti um calafrio formigar nos meus pés e acabar nos cabelos rareados da minha nuca. Ele beijou meu pescoço tão de leve que mais era um roçar de lábios do que um beijo pré-determinado. Eu deixei.
Acariciei sua bochecha esquerda com mais intimidade e Abelard respirou no meu ouvido. Receando, tentando se conter, se controlando ao máximo. Não, por que não? Sim, sim. Venha, mais perto, eu deixo, eu não condeno, eu abro mão, e posso amar.
Comecei a sentir o fedor da carne pútrida e o farfalhar de asas negras e agourentas. Ouvi risinhos debochados e uma voz reclamando que estava na hora de almoçar um belo frango assado... Um belo frango assado? Há quanto tempo eu não sentia o sabor da carne de uma ave esquentando na minha boca. As aves que me cercavam agora eram corvos e urubus.
Abelard se aproximou com mais provocação e eu pressionei meus lábios contra os seus. Não conhecia aquele sentimento, aquela excitação, e aquele era o meu primeiro beijo. O que minha mãe pensaria ao me ver beijando outro homem, apertando seus ombros, abraçando-o com mais força para mais perto do meu corpo?
Que falta eu sentia de um toque humano. E mesmo que fosse o meu primeiro toque mais íntimo, parecia algo que eu não sentia há tanto tempo... Abelard foi carinhoso e calmo, me ensinando com delicadeza a dança dos lábios pueris, com um toque de nostalgia, com algum cheiro que assimilei imediatamente à primavera. Primavera... Era isso! Abelard carregava na sua aura o cheiro constante da primavera. Aquele sol não tão quente nem tão morno, doces saindo do forno, um borbulhar de aromas das mais gordas e e belas rosas, glicínias, petúnias, orquídeas. Eu não compreendia o que estava sentindo, e talvez nunca na minha vida tenha me dado esse trabalho, mas aquela sensação nova, intensa, acalorada, o que seria de mim sem um pouco disso tudo?
- Chegamos. Vai lá e joga. - disse o soldado louro.
- O quê? Não quero chegar perto daquele lixão, não aguento mais aquele fedor desses ratos... Quanta mais eles morrem, mais aparecem... Parecem uma praga!
- Bem, de qualquer forma é a sua vez de jogar fora.
- O quê?
- Isso mesmo. Já despejei uns quatro só essa manhã, estou começando a ficar cansado.
- Mas eu também estava no outro setor fazendo o mesmo!
O soldado louro, contrariado e bufando de raiva, cedeu.
- Tudo bem, vamos juntos.
Abelard se afastou um pouco, desabotoou o casaco com calma e o jogou no chão. Em seguida foi a camisa branca de mangas longas, as botas e a calça. Pude admirar seu corpo tanto pela luz do luar que entrava por uma única janela descoberta quanto pelas várias lamparinas e velas. Ele era perfeito com seus músculos bem torneados e esticados na pele suavemente parda, as coxas malhadas, os peitorais e ombros largos, os mamilos róseos, o pescoço sinuoso, alguns sinais nos braços e na barriga rígida.
E era uma vez um lobo feroz e descontrolado apaixonado por um leão, que abandonou sua matilha, se recusou a caçar por sete dias, abdicou das estrelas e do Deus Sol, contou cada passo seu na floresta, apenas para morrer na boca daquele que ele amava. Ele era agora parte desse leão, ele estava dentro do leão. Eu sou o leão, seu assassino, seu amor.
Fui jogado em cima de algo mais duro e fétido. Um corpo, dois corpos, vários, uma revoada escura e irritante como gotas de lama num copo de leite. Corvos e urubus cantando um réquiem já conhecido por todos aqueles que um dia já tiveram o medo da morte. Vi de relance os dois soldados se afastarem da vala conversando despreocupadamente. Comecei a me esforçar para me mexer, saí daquela posição constrangedora e passei a engatinhar no meio dos corpos ensanguentados e transbordando vermes, olhos pulados, estômagos para fora, fezes e vômito. Não parei, não aguentava aquele fedor, usei todas as minhas forças para um ponto escuro que chamou a minha atenção. Pois quando o Cristo Crucificado que havia me alimentado com pão e água pela manhã me abraçou, ele não apenas me aqueceu e fez voltar por pouco tempo a sensibilidade na minha pele. Ele me contou também um segredo.
Fiquei em pé, apertei minhas mãos entre as minhas coxas. Caminhei com cuidado, um certo medo de mãos dadas com a insegurança. Eu não tinha ideia do que estava fazendo e no entanto tinha a certeza de cada mover de dedos e cada mínima raíz de cabelo ficando em pé na minha nuca, braços e pernas. Meu coração parecia fora do lugar, e depois senti-o despencando do seu lugar de segurança, se dissolvendo em ácido desiderato, evaporando dos meus poros, me fazendo suar. Fiz de Abelard meu escravo, beijei-o, deitei-o embaixo do meu corpo ofegante e compulsivo, desesperado por descobrí-lo, eu o amei. E Abelard, insatisfeito, ressurgiu das trevas, fez-me seu abrigo, seu antro de calor e compaixão, entregando-me a dor aguda e brusca, presenteando-me com o cheiro dos seus cabelos negros e lisos, a pele salientada das suas axilas, os poros ásperos do seu pescoço e das suas bochechas, seus antebraços me pressionando com força contra seu tronco. Maxilar de Aquiles.
- Heil, Hitler!
- Heil, Hitler!
Seriam soldados se aproximando para jogar mais corpos na vala? Eu não poderia saber. Cada músculo e osso doía como se estivessem em brasa, e eu só tinha um único objetivo na minha frente, afundando minhas mãos e joelhos que engatinhavam sobre corpos e neve. Aquele meio-túnel parecia mais claro, mas eu não poderia esfregar os flocos dos meus cílios pois não queria corres o risco de infectar meus olhos com aquele fedor pútrido e carnicento. Mais perto, mais um pouco, e eu poderia, talvez, de alguma forma, e sem precisar de motivo algum, ser salvo.
Acordei com meu rosto direito ardendo e minhas pernas esquentando. Meu cobertor estava sendo consumido por chamas. Afastei-me dele imediatamente tateando ao redor à procura do pequeno corpo de Emeline. Abri os olhos e um branco lusco-fusco me cegou por alguns instantes e fez minhas pupilas dilatarem, até elas se acostumarem com toda aquela luz. Era noite, o estádio de boxe estava destruído pela metade e Abelard caminhava sobre os escombros, a comida atingida e tostada, inútil.
Emeline gritou e se agarrou ao meu corpo imediatamente. Abelard nem olhou para mim.
Estonteado e enjoado me levantei, procurei apoio mas não havia nenhum. Comecei a ir em direção a Abelard que andava para lá e para cá como um filhotinho procurando pela mãe desaparecida.
- Abelard...
- Eles estão vindo...
- Abelard, vamos sair daqui.
- Eles estão vindo...
- Abelard, me escute!
Abelard me olhou assustado, como se eu fosse um estranho que acabara de entrar na sua casa sem permissão. E então franziu o cenho, abaixou a cabeça e se pôs a chorar.
- Abelard por favor, agora não é a hora...
- Não Audrick...
- ... de se lamentar, vamos embora daqui, vamos...
- Não Audrick!
- ... procurar outro lugar, outro abrigo, qualquer coisa...
- NÃO AUDRICK!
- ... MAS VAMOS SAIR DESTE LUGAR AGORA!
Emeline chorava no meu ombro, agarrada ao meu pescoço, e de repente senti que ela estava pesada demais. O barulho voltou, as luzes voltaram. Sirene, e o vermelho, as caminhonetes marrom-escuras enxotando soldados e mais soldados com a insígnia da Suástica nas mangas dos uniformes.
- Abelard, não faça isso comigo. Não enloqueça agora. Vamos sair daqui, eles estão chegando, precisamos nos esconder!
Abelard piscou os olhos várias vezes, pressionou os dedos contra as pálpebras, parecendo enfim ter voltado a realidade. Ele me olhou com um arrependimento que estraçalhou o que restava do meu coração.
- Vamos, Audrick.
Enfim cheguei ao outro lado da vala. Com toda a força que dediquei às minhas mãos, tirei um dos corpos que tapava o caminho para aquela discreta saída que nenhum soldado teria a coragem de olhar. Entrei no buraco, puxei um corpo para tapá-lo novamente e penetrei na lama, de olhos fechados, sentindo minhocas e baratas formigarem ao redor do meu corpo, mas apenas seguindo aquela trilha infinita para uma, talvez, utópica liberdade.
Abelard estava na frente, olhando de relance nas esquinas para confirmar se havia perigo de atravessar tais ruas ou não. Corremos e corremos, até que chegamos a um quintal de uma casa abandonada, onde se ocultava entre alguns pinheiros um lago congelado. Tentei discernir melhor o lugar com minha visão fálica, mas o grito de Emeline no meu ouvido me deixou atordoado quando Abelard escorregou na lama com suas galochas vagabundas e afundou na água quase imperceptivelmente. Deixei Emeline encolhida entre algumas moitas e fui em direção ao lago, procurando desesperadamente o buraco onde Abelard havia entrado. Mas a noite me impossibilitava, o luar estava nublado, e onde estavam agora as estrelas quando elas me eram tão necessárias?
- Abelard, não...
Comecei a chorar, mas sem perder a calma e o auto-controle. A camada de gelo estava grossa e impossível de quebrar com as mãos, senti uma vibração, um baque, e me ajoelhei para sentir melhor, colocando meu ouvido na textura fria e dolorosa da água estática. Afastei com as mãos os flocos de neve apenas para ver melhor através do gelo liso e transparente, voltei para perto de Emeline e tirei da sua mochilinha uma lanterna, correndo mais uma vez para o lago, escorrendo e batendo os joelhos excruciantemente. Mas eu não poderia me permitir sentir dor.
Procurei agora com a lanterna o buraco, e nenhum sinal. Retomei o lugar onde havia sentido a vibração. Céus, já devia ter se passado um minuto!
Iluminei a transparência do gelo e vi o rosto de Abelard se afogando, batendo naquele muro rígido e egoísta enquanto seus últimos resquícios de oxigênio acabavam.
- ABELARD! POR FAVOR ABELARD! ENCONTRE DE NOVO A SAÍDA!
Solucei escandalosamente, comecei a bater no gelo. Tirei minhas luvas e ferí meus dedos e punhos, arranhando e esmurrando. Peguei a lanterna de novo e Abelard estava piscando de forma lenta e compassada.
- ABELARD! VOLTE!
Ele ainda estava movendo braços e pernas, mas o seu ritmo estava ficando cada vez mais lento e insuportável.
- ABELARD! NÃO ME DEIXE AQUI!
Abelard fez um movimento de "não" com a cabeça, e então tentou falar algo, que eu só pude adivinhar lendo seus lábios.
Não olhe para mim.
Ele desapareceu, desisti da lanterna, desisti dos meus punhos. Coloquei minha testa no gelo e o meu choro vinha em espasmo musculares, movimentos inconscientes. Nenhum deus, nenhuma estrela, nenhuma noite ou primavera poderia ter ideia da dor que crescia dentro de mim e se expandia como um monstro de várias pernas e braços, dentes e olhos, sugando não meu coração, mas minha alma. Eu não sentia mais meu corpo, parecia estar fora dele, e no entanto ainda o sentia ser corroído pouco a pouco por esse monstro feroz e insaciável. Não seja a primavera que ele te foi, não seja o abandono que ele te desprometeu.
Minha alma estava num fundo de um lago, congelada, com todo o seu direito de oxigênio roubado. Morta.
Um feixe de luz penetrou nos meus olhos remelentos, esperei para enxergar melhor, o túnel estava acabando. Aquele era o fim. Me prometa, aquele era o fim.
- TIO AUDRICK!
Saí escorregando e me debatendo do lago. Emeline estava suspensa por um soldado. Eles ouviram meus gritos, captaram a luz da minha lanterna, perceberam meu choro naquele bairro fantasma. Emeline, Emeline não. Abelard, por favor Abelard.
O cachecol de Emeline indo embora na ventania, sua boina azul-marinho caindo na neve lamacenta e sendo pisoteada. Corri para ela, para buscá-la, para tomá-la aos meus braços. Recebi uma nocaute do cabo de uma espingarda, quebrando meu nariz e me desequilibrando novamente ao chão.
- Não a toque, seu doente desgraçado. Ela agora é nossa.
As luzes de algumas casas se acenderam. Então não haviam todos indo embora? Alguns ainda estavam lá?
- Tem certeza? - perguntou uma voz.
- Absoluta. Não vão sentir falta dela. E crianças só atrapalham.
Um tiro espantou os moradores que haviam acendido suas luzes e agora as estavam apagando novamente. Tentei me levantar me segurando no tronco de um pinheiro, mas meus joelhos falharam de novo quando vi o corpo de Emeline ao redor de um crucifixo vermelho. Suas perninhas tortas, sua cabeça brotando uma fonte de sangue, seus olhos abertos, suas mãozinhas frágeis afundando naquele oceano branco e sem sentido.
Escavei o feixe de luz até ele se tornar maior, eu sabia, dessa vez eu tinha a certeza, e ninguém teria o direito de roubá-la. Saí do tunel e senti o cheiro da primavera que Abelard carregava, a presença cálida e etérea de Emeline, como se ambos estivessem segurando minhas mãos. Alí estavam eles, Abelard e Emeline, de costas para mim, olhando o horizonte e me esperando ficar entre eles. Já estou indo, estou quase pronto, estou quase lá. Porque agora eu estou livre, porque agora eu sou livre. E eu tenho o cheiro das rosas e o sabor dos mais caprichados doces, eu tenho o calor do meu primeiro beijo e tenho a minha filha, e tenho também a música e a poesia, e tenho toda arte que quiser ter.
E isso ninguém vai me tirar.
~
Andrew Oliveira
Artes: Hikari Shimoda
segunda-feira, 16 de abril de 2012
Can't let you go
Vou burlar todas as regras
E uma hora você irá voltar
De todas as formas
Te farei voltar
Como a mais longa e mais fina
torrente de agonia
Desmarca
Me marca de novo
Me persegue
Ele cai e quebra
E eu me invento
Feito de vidro, feito de vento
O que posso fazer a não ser caminhar
Não de verdade, mas há
Ao teu lado
Me sufoca, mesmo que eu possa gritar
Me recuso a ter voz, me recuso a enxergar
O que vai acontecer de novo?
Brincar de amor, brincar de solidão?
Solidão se faz de verdade, nunca brincadeira
Onde estiveste então?
O ponto, o meio, o recomeço
Em fim, em desamparo
Quero apenas que isso
Não aconteça de novo
Cada toque, cada pretensão,
Cada pequeno, mínimo, ínfimo, inferior
Desejo
Não era para ser assim
Não era para ser desse jeito
Veja a noite que te avermelha
Veja o dia em que acordas assustado e
por que assim
volta a dormir
Sem despertador, com medo,
Infeliz, tu não soubeste?
Falei de novo
Dessa vez eu quis falar
Fale, fale, espere
A hora que nunca vai chegar
Mas não se desespere
Vá embora como a hora, vá embora como agora
Vá embora pra não demorar, pra não se lembrar
Que isso só te destruiu.
~
Verano
As Bruxas vão voltar
~
Black Cherry
Arte: Nicole Absher
sexta-feira, 13 de abril de 2012
Lies
Você nunca vai me amar, então qual é a novidade?
Qual é o ponto de um jogo que você vai perder?
Qual é o ponto de dizer que me ama como um amigo?
Qual é o ponto de dizer que isso nunca vai acabar?
Você se orgulha em dizer que cometeu um erro
Você é um covarde até o fim
Eu não quero admitir, mas nós não vamos nos encaixar
Não, eu não sou do seu tipo
Por que não podemos apenas fingir?
Mentiras, não quero saber, não quero saber
E eu não posso deixar você ir
Eu só quero que seja perfeito
Para acreditar que tudo tenha valido a luta
Mentiras, não quero saber...
Você sempre só me toca no escuro
Apenas quando está bebendo você consegue ver a minha centelha
E somente no final que você dá um pouco de si mesmo para mim
Porque a noite é sua mulher, e ela vai te libertar
Você se orgulha em dizer que cometeu um erro
Você é um covarde até o fim
Eu não quero admitir, mas nós não vamos nos encaixar
Não, eu não sou do tipo que você gosta
Por que não podemos apenas fingir?
Mentiras, não quero saber, não quero saber
Eu não posso deixar você ir, não posso deixar você ir
Eu só quero que seja perfeito
Para acreditar que tudo tenha valido a luta...
~
Marina Lambridinis [ Marina + The Diamonds ]
quarta-feira, 11 de abril de 2012
All Is Full Of Love
No clima do curso que estou fazendo aqui em Belo Horizonte, Cinema e Audiovisual, aqui vai na íntegra meu trabalho de Cinema de Animação. A regra era escolher um diretor e falar sobre ele ou sobre alguma de suas obras. Eu, obviamente, escolhi sem nem mesmo pensar All Is Full of Love da minha deusa Björk, dirigido pelo badalado e genial Chris Cunningham (conhecem Frozen da Madonna? A mente por trás desta Hécate pop e tão bem representada é ele.).Chris Cunningham é um cineasta britânico de videoclipe e video-arte. Ele nasceu em Reading, Berkshire, em 1970, e cresceu em Lakenheath, Suffolk. Além de cineasta, é músico, produtor e fotógrafo. Responsável por um dos videos mais emblemáticos de todos os tempos. Preparado? =)
Um robô é uma criatura inorgânica, ausente de sentimentos, gestos involuntários, vazio e gelado, movido por engrenagens lubrificadas com óleo, moldado a partir da matéria prima de metais, pesado, perigoso. Uma imitação do ser humano, um manequim mais forte e rígido, uma bizarrice bela da tecnologia, uma representação de atitudes humanas e, sendo assim, de um grande significado imagético, um robô é uma máquina criada apenas para determinada função, e sendo assim ele deve fazê-la repetidamente sem a interrupção do chamado "cansaço humano", sua inteligência é mecânica e limitada, nascida de cabos elétricos e chips, perfeita para acelerar a produção de mais máquinas, mais inteligências iguais, um rebanho de ferro e parafusos criando exércitos das mesmas coisas fazendo as mesmas operações criadas das mesmas funções.
Talvez seja importante, então, a ausência de sentimentos, a frieza e, de certa forma, a crueldade em ser um boneco verossímil do corpo humano. Um robô não tem músculos, artérias, ligamentos cartilaginosos, pele e sangue. Mas ele tem uma força maior, um desenvolvimento indestrutível, é mais eficaz e menos fálico, uma disposição que os limites humanos não permitem. É verdade que um robô uma hora começa a apresentar problemas, e rapidamente pode se quebrar, sua bateria acabar, seus cabos arrebentarem, mas tão velozmente quanto ele é destruído, ele é substituído por um novo, um modelo mais avançado, com mais funções, com menos probabilidades de sua data de validade se aproximar. Um robô é um reflexo de uma criatura colossal e faminta, cheia de tentáculos venenosos, barulhenta e aterradora, chamada Ego.
Seria completamente impossível então, duas criaturas com os mesmos mecanismos, o mesmo pensamento pré-determinado, a mesma forma e compartilhando da mesma consciência imitada, se amarem? Sentirem o toque de suas entranhas frias, partilhando de gestos incompreendidos, se oferecerem, se entregarem?
Chris Cunningham obviamente, não deixa claro se o tempo que vemos passar é cronológico ou psicológico, se suas duas personagens, as duas Björk's robóticas e melancólicas, podem ser a representação de uma sátira às condutas humanas, aos seus limites e valores de impor definições a sentimentos que eles próprios, os seres humanos, não entendem.
Somos convidados a entrar numa clínica para reparos de robôs defeituosos, vemos e ouvimos a robô cantar sobre o amor, declarar os sentimentos de outrem que se fechou com o medo da mais simples permissão de amar. Para quem ele canta? Alí há apenas ele e grandes parafuseiras terminando de moldá-lo, fazendo seus últimos reparos. O que aconteceu com um robô que canta sobre o amor estar alí precisando de manutenção? Algo nele não deu certo?
As cenas movem-se então como se estivessem voltando, a lubrificação, a água, retorna. A água nunca retorna, ela segue seu rumo e encontra caminhos até mesmo entre rochas e colinas, na terra e no fogo, já disseram provérbios chineses. A água é a metáfora perfeita do tempo, o tempo cronológico é claro, pois quem pode controlar o psicológico? É estranho pois passamos a entender que, em vez de estar sofrendo reparos, o robô está sendo destruído pelas máquinas de manutenção, aquelas que até então tinham a função apenas de renovar e construir. Mas o outro robô, idêntico ao primeiro, entra em cena, ele o convida, ele canta junto, e como o seu parceiro, possui seios artificiais para identificar seu sexo. Duas robôs que se comunicam, veem algo em comum, elas não estão sendo renovadas, estão sendo desconstruídas, pois muito provavelmente estão ultrapassadas ou suas datas de válidade já chegaram.
Há então uma explosão de mensagens num único gesto, a robô a convida para sair daquele lugar, e juntas impulsionam a maior forma física de amar: o beijo. Elas não veem diferenças, são iguais, e quando há o amor surgindo, quem terá o direito de julgar sexo, gênero ou cor? Elas precisam daquilo, elas estão sendo extintas, estão sendo assassinadas lentamente pelas máquinas que não permitem que robôs tenham sentimentos, se declarem, se comuniquem e, acima de tudo, sejam humanos. Estão sendo oprimidas pelos seus iguais, pois elas também são máquinas, há uma anarquia imposta pelas ditadoras mais fortes e soberanas naquela sociedade, as que constróem e destróem e, por isso, tem a consciência de que podem fazer o que lhes for conveniente. Afinal, as máquinas opressoras também tem sentimentos, porque elas não estão permitindo, elas estão sendo hipócritas e contraditórias com suas crenças de que duas robôs idênticas não podem amar.
Uma contradição, obviamente, ainda maior e mais forte presente no curta, é a ironia extrema de dois robôs amando, levando-nos às vertentes das críticas sociais sobre a frieza humana, os estereótipos, o conformismo em ser igual, em não fazer tanto quanto deveria, apenas seguir aquilo a que lhe foi designado. A fotografia final nos faz captar que as duas robôs apaixonadas estão no meio de um coração, formado pelos braços violentos das máquinas opressoras que estão destruindo-nas enquanto estas usufruem dos seus últimos momentos antes de suas células de bateria acabarem. Uma ironia ainda maior, é claro, pois aquilo que as destrói, é aquilo que forma o que elas acreditam terem: o órgão representativo do amor, o mais vital e protegido na caixa torácica, a queda livre, a pulsação mais forte, o calor mais intenso, a dor mais impiedosa: o coração.
"Você receberá amor,
Deixe-se receber os cuidados,
Você receberá amor
Permita-se confiar nisso
Talvez não das fontes
Em que derramastes
Talvez não das direções
Em que ainda observas
Mova sua cabeça
Está tudo ao seu redor
Tudo está cheio de amor
Tudo ao seu redor
Tudo está cheio de amor
Você apenas não está recebendo
Tudo está cheio de amor
Seu telefone está fora do gancho
Tudo está cheio de amor
Suas portas estão todas fechadas..."
Permita-se confiar nisso.
~
Black Cherry
quinta-feira, 5 de abril de 2012
Modos
Não estou triste por você
Não estou triste por mim
Estou triste por você não existir por mim
Se pudesse te ser de verdade
Se pudesse não mais no onírico
ser o que eu um dia queria saber
Ouça o mundo de novo, ouça o encanto
Pare para escutar com atenção
Não como se fosse um abraço
A textura é leve, o pensamento pesa
Está tudo certo, está tudo bem
Não tenta de novo, não fracassa
E oh, por que fui tão insistente?
E dentro de você eu permaneço
És de todas as formas, meu maior esconderijo
Meu mais belo ato de covardia
Seguro, não me envolva
Eu estou bem, sem tanta certeza
E eu não sei porque, mas porque tá perdido
Se fantasma, se desrecordação
Carne taxidérmica, distância
Não quero me renovar ao teu toque
Jamais
~
Verano
Arte: Hikari Shimoda