Solitude, darkness and love


"I don't wanna admit, but we're not gonna fit"

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Vespertine - Capítulo 4: It's not up to you



Acordar talvez não tenha sido a melhor ideia do mundo, mas não acordar seria uma ideia ainda pior. Acordar para o mundo já é um grande desafio, acordar para a realidade fria e sem cor. Acordar com uma ânsia, um vazio que te dá o gosto do próprio estômago. E não acordar? Viver sempre de sonhos e esperanças? Seria tão ruim assim pegar um pedaço dos olhos de Deus e colocar no teto da terra? Um pedaço do céu?

Nina não havia se perguntado desde que acordara porque aquele pedaço celeste estava alí, talvez já estivesse acostumada com a ideia de um mundo onírico, mas por causa de um terrível acontecimento havia esquecido como eram os olhos do deus em que ela já acreditara em outrora, e aquele pedaço pregado sob o teto da terra não era mais do que uma bela imagem projetada pela natureza, e não deixava de ser.

O anjo que descia dali era pálido, parecia estar com frio, suas asas batiam lentamente hipnotizando Nina como magia, descia como se estivesse em uma escada, gracioso e cheio de gestos, sorriso de criança, cabelos negros e lisos, mas não grandes. Parecia estar falando alguma coisa, mas Nina não ouvia, ela queria ouvir, sim, ela queria ouvir muito, mas não conseguia, o ferimento na cabeça era tão forte que não parava de sangrar, uma ânsia de vazio voltava para o seu corpo, pequenos choques a arrepiavam, seus olhos estavam fechando lentamente e aquele nevoeiro matutino estava voltando, em sua direção, muito claro, muito claro, claro demais...

- Nina? - A voz masculina soou tão dócil.
- Quem é você? - Perguntou Nina meio ainda meio inconsciente, esfregando os olhos para esquecer-se da intensa claridade.
- Sou um mensageiro, me chamo Paz.
- E o que a paz deseja neste mundo tão sórdido?
- Avisar à você sobre algo que ocorrerá daqui há poucos dias.
- É algo bom?
- Não.
- E por que a Paz quer avisar sobre algo que não é bom?
- A decisão não é minha. Só quero avisar que você não deve mais ficar olhando para o que já passou.
- E isso não é bom?
- Pra você, sim.
- Eu quero Sofia de volta, por favor, você deve ter algum poder pra isso.
- Já estava na hora de Sofia partir, Nina, tente entender isso.
- Eu não entendo, por que tantas pessoas morrem sob minhas mãos... - Entristeceu-se. - Ela era tão nova, não tinha que partir!
- Mesmo se ela não morresse hoje, Nina, amanhã ela morreria por outro acidente com toda a certeza.
- Eu... eu só não queria que ela morresse nas minhas mãos... - Chorou.
- Nina, eu sei de toda a sua história. Sei do seu marido que também faleceu de um acidente terrível. Mas celebrar a morte também faz parte da vida.

Nina chorava copiosamente na frente do anjo que a encarava compreensivo, já não aguentava mais tanta dor em sua vida. Desejava tanto que o mundo parasse para ela, mesmo sendo tanto egoísmo, mas só por alguns segundos, para sentir como é respirar livre novamente, como é ser livre, e não estar presa em sentimentos sombrios. Ela queria de novo o perfume doce de Sofia, e sua caixa de música que tocava sem parar, a companhia de seus amigos, o abraço quente de seu marido, Nina queria o mundo sorrindo de volta para ela, Nina queria demais. Mas estes já não eram os próprios sentimentos sombrios?

- O que você fará agora?
- Eu não farei nada, as decisões são suas, Nina. Viver ou tentar viver.
- Eu já não suporto mais... Tudo isso, todo esse movimento me dá tonturas.
- O mundo não pode parar para você, Nina. Mas se você quiser, você pode continuar caminhando sem parar.
- Dói tanto.
- Viver é uma dor, a pior e a melhor delas.
- E se você pudesse reviver Sofia?
- Eu teria que ter algo em troca.

Nina pensou ter ouvido uma bela canção sussurrada ao ritmo lento de uma harpa, uma voz chamava por ela, então, desafiou:
- Como o quê?

O anjo a encarou fixamente, mais uma vez, seus olhos perderam o brilho, ele não queria falar, mas sua boca pensou antes que ele pudesse raciocinar:
- Uma vida.

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