Solitude, darkness and love


"I don't wanna admit, but we're not gonna fit"

sábado, 16 de abril de 2011

Ócio


Era uma vez a sombra.

- O que mais você quer?

E depois as questões, jogadas para o céu como estrelas sem asas.

- O que mais você poderia querer?

Então veio um chamado, uma sirene, um chiado.

- É, é essa a canção. Estou cansado, sabe. Ela vem e lamenta, penetra no meu cérebro como se me abduzisse.

Um sorriso que nunca foi feito.

- No caminho de volta pra casa, acontece exatamente assim. E pra quê explicar? É algo que apenas se vê, quando mal se vê.

- Então eu caminho, e uma força me escurece. Queria tanto saber sorrir.

Queria tanto saber amar.

- O amor não é algo que se aprende. Ele vem e depois vai, são como ondas, são todas iguais, quer dizer, quase iguais. O que difere é que são outras águas. E um abraço que nunca vai acontecer. Se acontecer, realmente é o destino.

- Não quero amar as ondas.

Não se deve amar algo que você sabe que vai embora sem dar satisfações.

- É quase escuro. Só não é mais porque eu não deixo.

E sabe o quê mais?

- As coisas deveriam acontecer do meu jeito, pelo menos um pouco, pra variar... Um desejo de desaparecer por completo. Não por vergonha ou medo. É apenas isso. Não é questionável a vida tão curta de uma borboleta?

- Eu queria correr nu pelas florestas, e me banhar de rosas num jardim dos céus. Morrer para este mundo.

É, morrer, é sempre essa a solução pra tudo. Haveria outra?

- A morte não dói tanto quanto isso.

Ou pelo menos não deve doer...

- E minha cabeça flutua, se esvai. Fumaça.

Os fragmentos são como frutas secas num cesto.

- São sim.

Enquanto se banha, se pensa, e se chora.

- Mas eu não chorei.

Sim, você chorou. Eu vi.

- Eram lágrimas de cristais, que congelaram meus cílios, e racharam minhas pálpebras. Aurora de depois de amanhã.

Vou guardá-las num quartinho sem janelas. Elas se lamentarão sem precisar de você.

- E o que eu sou?

Uma constelação sem estrelas.

- É um bom eufemismo, ou paradoxo...

É sim.

- E o que mais?

E o que mais o quê?

- O que mais eu poderia fazer? Estou cansado disso. Eu quero ser mimado, eu quero uma felicidade que dure mais de duas semanas. Por que tudo desmorona quando sempre chego no topo? Não quero mais chegar no topo. Vou me afundar num abismo e me enterrar num sarcófago de um milhão de anos. E daqui há um milhão de anos vocês vão me ver, novo em folha. É, isso mesmo, acabei de decidir.

Você é patético.

- É claro que eu sei disso.

As pessoas são assim.

- Eu não culpo as pessoas, eu não culpo ninguém. Afinal, quem se fode todo no final é só eu... ninguém está disposto a admitir nada, é simples.

Pare de ser tão auto-deplorável.

- Não é assim que as coisas são feitas?

Uma lâmpada pode ser uma estrela.

- Mas uma estrela é grande demais, e distante demais, pra ser uma lâmpada.

Chama-se contraste.

- Contraste?

Como as suas oscilações que nunca param. Você até a um minuto atrás estava numa felicidade torpe. Agora é só cinza.

- Eu sempre acabo em cinzas.

Cinzas.

- Por hoje eu poderia sorrir e chorar para todo o sempre.

E para todo o sempre sempre tem um fim.

- Isso todo mundo sabe.

Eu sei.

- Eu vou sonhar com um lindo jardim de girassóis. Nele, residirá a chave para a minha felicidade, como as coisas funcionam, sabe...

Isso tá parecendo vidro.

- Então vou arrancar novamente essa coisa negra no meu peito, isso que chamam de coração. Sempre que me entrego a um sentimento tão forte assim, é apenas eu quem acaba machucado. E ninguém percebe, ninguém pergunta. Desaparece. E ele fica mais e mais negro. Odor de morte.

- É claro.

Esse calor, esses braços.

- Sim, sim. Eu sonho com isso também. Sonho no dia em que ele virá com um beijo para me consumir, e neste beijo eu fluirei como se flui a tal borboleta. Isso é tão trágico que dá vontade de rir.

- Eu sei.

Então vá.

- Eu vou.

Descubra como se faz isso.

- Então lhe contarei todos os segredos do mundo.






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Black Cherry & Andrew Oliveira

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